A religião do Santo Daime foi semeada na Paraíba no II Encontro da Nova Consciência de Campina Grande de 1993, durante o Carnaval daquele ano, quando um ex- guerrilheiro e escritor, Alex Polari de Alverga, veio à cidade lançar o livro ‘O Guia da Floresta’, sob sua organização, com as palavras e os ensinos do Padrinho Sebastião Mota de Melo, o principal seguidor de Raimundo Irineu Serra (1890-1971), o fundador da religião no Acre. Alex fora preso político, durante muitos anos, abraçara a doutrina daimista, e muitos anos depois estava em Campina lançando o seu segundo livro sobre o Padrim Sebastião’- ainda publicaria um terceiro.
Diversos participantes daquele II Encontro foram iniciados no Daime, inclusive o famoso pastor presbiteriano Nehemias Marien e alguns campinenses. Sete meses depois, em 15 de agosto de 1993, aconteceria a reunião inaugural do núcleo da futura primeira igreja daimista fundada na Paraíba e no Nordeste, a Céu da Campina, inaugurada em 11 de outubro do ano seguinte, nos arredores da cidade de Lagoa Seca, na Paraíba. A doutrina ainda suscitava preconceito e desinformação, devido ao culto à bebida milenar que altera a consciência e amplia a percepção de si e do ser divino, feita do cozimento de um cipó (jagube) e uma folha (rainha).
Irineu Serra era um homem negro enorme, tinha quase dois metros de altura, descendente de ex-escravos, ele fora um dos milhares de imigrantes nortistas a debandarem para a Amazônia, atraídos pelo extrativismo da seringueira. Porém seria integrado a uma comissão de demarcação de fronteira, como transportador de pesadas malas de papéis e equipamentos. Trabalharia ainda de regatão, embarcando e desembarcando mercadorias nos portos fluviais acreanos.
Até que ele conheceu a bebida misteriosa na fronteira do Peru, através da qual teve visões espirituais da Virgem Maria (também identificada como Rainha da Floresta). A ayahuasca, a partir de Mestre Irineu, passou a se chamar Daime (no sentido rogativo do verbo dar, pedindo amor, saúde, firmeza e tudo mais). A Virgem Mãe ainda o revelaria os cânticos divinos e instruiria ao fardamento dos seguidores e na ordem da dança sagrada (o bailado), realizadas nos principais eventos do calendário daimista, conforme as datas máximas do calendário católico.
O Daime floriria na comunidade do Alto Santo de Mestre Irineu. Após a sua morte, aconteceriam as expansões, sendo a principal delas a igreja da Colônia Cinco Mil do Padrinho Sebastião Mota (a atual sede desse povo daimista-sebastianista, a Vila Céu do Mapiá, fica no meio da Floresta Amazônica), cuja comunidade primitiva acolheria mochileiros e hippies e outros jovens de origem urbana, inclusive o mencionado ex-guerrilheiro que muito tempo depois viria lançar o tal livro ‘O Guia da Floresta’ no evento da Nova Consciência de Campina.
O semeio de Alex Polari de Alverga nesse evento germinou, cresceu e frutificou na igreja Céu da Campina, da qual é patrono, a qual irradiaria no Nordeste a doutrina de Mestre Irineu, revelada no seu maravilhoso hinário ‘O Cruzeiro, assim como os ensinos do Padrinho Sebastião contidos no seu hinário ‘O Justiceiro’.. Quase todos os núcleos e igrejas dessa grande região do Brasil foram criadas por daimistas iniciados nessa igreja paraibana pioneira: o Céu de São Lourenço, em Recife; o Céu do Ceará, em Fortaleza; o Céu de Coqueirinho, em João Pessoa; e outros núcleos e centros irineu-sebastianistas. Isso desde há 30 anos!
Publicado no Jornal A União, edição 169, quinta-feira, dia 17 de agosto de 2023
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